23.12.15

US 395 - Jawbone Canyon

A estrada corta o deserto em Jawbone Canyon: cenário de filme, caçada a criminoso e solidariedade americana

Sabe aquele filme A morte pede carona? Mas o original, com Rutger Hauer no papel do vilão? Pois é.  Para quem viu aquele filme numa das sessões da tarde da vida, ele é inesquecível. E quando se dirige por estradas praticamente vazias, no meio do deserto californiano, é quase impossível não se lembrar dos apuros de C. Thomas Howell ao dar carona ao desconhecido.


Na chegada, relativa tranquilidade...

Precavido que somos, claro que não demos carona para ninguém, mas depois que saímos de Red Rock Canyon vivemos momentos de apreensão.


Arthur brincando com Blue

Cachorros fogem do calor na câmara frigorifica











Ainda em Red Rock, um outro viajante chamou a atenção para um problema no nosso carro: o aerofólio frontal, sob o motor, havia se soltado em quase sua totalidade, e arrastava-se pelo chão. Não dava para arrancá-lo e colocar na mala e, assim, a viagem dali para a frente se tornaria muito perigosa em termos de segurança e ainda corríamos o risco de ser parados por alguma highway patrol e levarmos uma bela duma multa.



A solução, então, foi buscar o aglomerado populacional mais próximo para tentar resolver a situação. Saímos de Red Rock quase pelo acostamento,  com pisca-alerta ligado, e eis que, em menos de 500 metros, avistamos uma espécie de condomínio.

Embicamos o carro naquela direção, onde nos deparamos com diversos carros de polícia e até um helicóptero pousando naquele exato momento. Estranhamos duas coisas: o xerife atravessou seu carro no meio da pista e, ao avistar o nosso, levou a mão à arma. Imediatamente abrimos o vidro e mostramos que éramos uma família.  Ele tirou a mão da arma, e pudemos explicar o que havia acontecido e pedir ajuda.


Jawbone é isso aí. E só. Nos fins de semana rolam encontros de motoqueiros e show de rock e bebedeira

Sem muito se alongar, o xerife nos disse para buscar ajuda num posto próximo dali, a uns 200 metros mais ou menos. Falamos de nossa preocupação com uma possível reprimenda da polícia e ele disse que estava tudo bem. Seguimos a orientação e nos dirigimos ao posto que tinha o sugestivo nome de Jawbone (algo como osso de maxilar) Canyon.


Flávio e a estrada deserta: no verão americano, o calor é infernal na região

No local fomos super bem recebidos e rapidamente dois ou três moradores da região se prontificaram a nos ajudar. Enquanto isso, Arthur se divertia com dois simpáticos cachorros que buscavam abrigo do calor dentro da câmara fria do lugar (Blue e Bear) e nós aproveitávamos para exercitar nosso inglês um pouco mais, conversando com os simpáticos Dave e Kimberly, que acabariam se tornando nossos anjos da guarda.


Kimberly, com Fernanda, Arthur e Bear, o simpático cão que dorme no frigorífico

O problema do carro não pôde ser consertado e o jeito foi ligar para a locadora e pedir outro veículo. Só que a SIXT não tinha loja próxima de onde estávamos, a cerca de 300 quilômetros de Los Angeles. Pior, era sexta-feira, dia de trânsito infernal naquela cidade e a locadora também não dispunha de carros para fazer a troca. Muita briga, muita discussão ao telefone e a primeira previsão era de que o carro chegaria em aproximadamente três horas. Eram 14h àquela altura. Só que o posto de gasolina e a loja de conveniência fechavam às 17h, ou seja, na melhor das hipóteses, o veículo seria substituído no limite de horário.


Deixando Jawbone seguindo Dave e Kimberly por pelo menos uns 20 quilômetros

A situação, no entanto, se agravou quando a locadora admitiu não ter previsão de entrega de outro carro para antes de 20h. O que nos restaria fazer, então? Ficar ali, no meio do nada, dentro do carro? Já estava convencido a fazer isso, mas o que descobrimos depois nos deixou apavorados: aquele grupo de policiais pelos quais havíamos passado estava caçando um assassino que matara um homem na região na noite anterior e se refugiara por aquelas bandas. O sujeito ainda havia mantido reféns três jovens durante horas, ameaçando-os de morte. Fugiu com a chegada da polícia.

Para aumentar a tensão, até mesmo um ranger que não costuma andar armado, apareceu no posto com uma pistola na cintura e falou de suas preocupações. Caraca, e nós ali, no meio daquela loucura com uma criança de 8 anos...

Procuramos manter a calma. Telefonamos diversas vezes para a locadora, descascamos os atendentes, explicamos o risco que estávamos passando e nada. Portanto, um conselho, em caixa alta: NUNCA ALUGUE CARRO DA SIXT. Eles vão te deixar na mão se você precisar.


Seguindo Dave e Kimberly numa estrada ainda mais deserta

Para nossa sorte, Dave e Kimberly se mostraram realmente anjos. Ambos ex-militares, os dois se prontificaram a nos guiar, por uma estrada secundária, até um hotel numa cidadezinha chamada California City, onde nos acomodamos num Best Western excelente até a chegada do carro substituto, isso somente às 21h!


No fim das contas, o dia terminou assim no hotel Best Western de 'Cal City', apelido da localidade

No dia seguinte, foi acordar, pegar o carro e meter o pé na estrada até Los Angeles, e sem paradas pelo caminho.


Carro trocado, som na caixa e uma constatação sobre o conselho da música: nem sempre, caro Dio, nem sempre.

Ah, e sobre a caçada ao criminoso, ela durou mais duas semanas, com direito a tiroteio, dois policiais atingidos e o foragido morto pela polícia...

Não levou fé na história? Então confere aqui:
A caçada ao criminoso

17.11.15

US 395 - Fossil Falls


A entrada de Fossil Falls: a impressão é que você está em Marte
O passo seguinte a Hot Creek foi outro lugar de geologia e paisagem incomuns: Fossil Falls. Aliás, a geografia e a geologia da Califórnia realmente surpreendem. Para quem gosta de estudar clima, formações e variações da natureza, o estado americano certamente é um campo fértil.

Tudo sempre bem sinalizado, com placas explicando a origem do lugar

Se em Monolake tinha-se a impressão de estar em solo lunar, Fossil Falls é algo que deve ser muito parecido com Marte. A região basicamente foi formada por rios de lava que se resfriaram rapidamente, criando uma espécie de vale de rochas metálicas com aquela aparência  enferrujada, bem no meio de uma região bastante seca.

Formações rochosas  do lugar 

A trilha até o cânion: aridez total

Rochas ou ferro retorcido? 









































Este mesmo rio de lava esculpiu em um trecho um cânion de uns 20 a 30 metros de profundidade, cujas paredes de ferro são ótimas para quem pratica escalada.

O cânion ao fundo

alpinistas aproveitam o lugar para fazer escaladas

Fossil Falls merece muito a visita e, assim como em outros lugares mais inóspitos, é recomendável boné, protetor solar e umas garrafinhas de água.





Quando você chega, há uma área para estacionamento. De lá, é preciso fazer uma caminhada de uns dez minutos por uma trilha até chegar ao melhor ponto de observação, de onde se vê todo o cânion formado por aquilo que um dia foi um rio de lava incandescente.




Logo que saímos de Fossil Falls, fomos até Red Rock Canyon, só que a visita a este outro lugar superinteressante terminou bem antes do que imaginávamos. E nossa aventura/drama começaria ali. Mas isso fica pro próximo post...

Aqui terminou nosso turismo pela US 395 e começou um capítulo no estilo "a morte pede carona"...


13.11.15

US 395 - Hot Creek

Hot Creek, em Hot Creek Gorge, com as águas ferventes e gêiseres, na US 395


A US 395 vai da froneira do Canadá até a cidade de Hesperia, no deserto de Mojave, na Califórnia

Hora de voltar à estrada, rumo a Los Angeles, parte final de nossa viagem. Como planejamos, o trecho seria feito pela estrada federal US 395. Mais uma decisão que se mostrou acertadíssima.


Para quem gosta de dirigir a US 395 é ótima

A US 395 é uma estrada linda, com variações de paisagens muito interessantes e que te colocam dentro de cenários dos famosos 'road movies' americanos. Há retas gigantescas em seu percurso, além de cidadelas mínimas, vegetação que se transforma e, finalmente, a aridez do deserto.


Pausa para mais um registro na estrada que tem mais de 2.100 quilômetros de extensão

Para cruzar os pouco mais de 518 quilômetros (324 milhas) de Lee Vining até Los Angeles, recomendo sair cedo, pois há muitos e muitos lugares bacanas para você dar ao menos uma paradinha de meia hora, uma hora, e admirar. Claro que também é para tirar aquelas fotos maneiras.


a estrada é convidativa...









... a paisagem vai mudando
... e ficando árida
























Nosso plano inicial era de fazer quatro a cinco paradas mas, por motivos que contaremos depois, acabamos fazendo apenas três visitas aos pontos que havíamos programado.


Dá vontade de acelerar, mas cuidado: a fiscalização é feita por drones

Nosso primeiro pit-stop foi num lugar muito interessante chamado Hot Creek (rio quente) para conferir, in loco, gêiseres e um rio cuja água, literalmente, ferve em seu curso.


Abaixo, o rio de água fervente

Placas alertam para o perigo


Lugar muito legal de visitar e, se você der sorte, pode avistar alguns animais da fauna local como lebres, cervos e até pumas. Feliz, ou infelizmente, só não avistamos o felino das montanhas.


Num determinado trecho a coloração azulada chama a atenção, assim como o vapor d'água saindo do rio


A área de ocorrência dos gêiseres fica interditada para evitar acidentes


O máximo que se pode aproximar com segurança é delimitado pela cerca: convém respeitar o limite


Quando os gêiseres aparecem, costumam projetar água fervendo a até dois metros de altura e a emitir um som característico, o popping, que significa 'estourar'.



10.11.15

Monolake


Monolake, em Lee Vining. Um lugar diferente de quase tudo o que você já viu

Depois de percorrer as ruas empoeiradas de Bodie, paramos para comer algo, na Whoa Nellie Delli e, de lá, seguimos direto para conhecer as belezas de Monolake. Na verdade, toda a Lee Vining fica de frente para o famoso lago.  A questão, então, resume-se a visitar os melhores pontos com aquelas formações incomuns.

No centro de visitantes: obsidian (Minecraft total)

Lá dentro: explicações geológicas e curiosidades




























Sugerimos dois pontos: o primeiro, onde há um museu/centro de exposições. Pequeno, mas muitíssimo bem montado. Lá há fotos, exposições e material interativo para você desvendar um pouco da curiosa história do lago.

Índios habitavam o local em suas ocas

No mesmo lugar, há uma indicação dos melhores trechos para apreciar as tufas (cinco pontos no total), aquelas formações rochosas que parecem estalagmites. 
A melhor e maior de todas fica na US 395 em direção Sul. A entrada é meio escondida, foi difícil de achar, mas conseguimos com um pouco de paciência e perseverança (umas duas ou três tentativas).

Em cada placa, uma explicação

As tufas no local de maior concentração de formações 

O visual parece meio pós-apocalíptico















Chegando lá, estacionamos o carro e caminhamos pelo local, muito bem sinalizado, com placas indicativas e informativas sobre a geologia da região. Pena que o sol desapareceu e, no fim da visita, chegou a cair uma chuva fininha, mas nada que nos atrapalhasse.



A água do Monolake é salgadíssima. Seu teor de salinidade atinge cerca de 20%, enquanto o da água do mar gira em torno de 3,5%, na média. Só perde para o Mar Morto, com seus 30% de salinidade...
Mais uma vez não se esqueça de garrafinha de água e algo para comer.  Se estiver fazendo sol,  um boné e protetor solar também são de grande valia.



A história do lago é interessante: ele se formou a partir de uma erupção vulcânica há cerca de 800 mil anos. Até os anos 1940, ele tinha praticamente o dobro do volume líquido que apresenta hoje. A redução drástica ocorreu quando o poder público decidiu captar suas águas para abastecer Los Angeles. Com a redução do espelho d’água  as formações calcáreas (tufas) submersas ficaram à mostra, criando a paisagem incomum.

















Ali, o legal é percorrer as tufas e admirar a paisagem. Proliferam por ali mosquinhas esquisitas, só encontradas naquele lugar, que não incomodam ninguém. Ficam aos montes no solo, são muito pequenas e servem de alimento para as aves. Portanto, não precisa se preocupar. Aliás, a brincadeira predileta das crianças é correr em direção àquelas manchas pretas no chão e vê-las movendo-se como uma nuvem, pousando imediatamente no chão.